De janeiro a abril, compras de vestuário de fora do país cresceram 331% sobre igual período de 2023, de acordo com levantamento da CNC. Taxa de 20% a partir de agosto muda o cenário?
O que pode ser um refresco para a indústria e o varejo brasileiro já tem data. A partir de 1º de agosto, os produtos importados por pessoas físicas de até US$ 50 pagarão uma taxa de 20%. Em sua decisão, o governo federal alegou que varejistas internacionais estavam se passando por pessoas físicas para enviar os produtos para o Brasil, driblando o recolhimento do tributo.
O fato é que a isenção do imposto já fez um estrago no comércio nacional, especialmente nos setores de vestuário, utilidades para cozinha, artigos de higiene e beleza e eletroportáteis. Levantamento da CNC (Confederação Nacional do Comércio) mostra que, de janeiro a abril deste ano, a importação de alguns produtos subiu mais 300% sobre igual período de 2023.
Com base em informações da Secex (Secretaria de Comércio Exterior), a CNC selecionou alguns dos produtos de até US$ 50 mais importados neste ano. No topo estão os artigos de vestuário, com alta de 331%, seguidos por garrafas térmicas e outros recipientes isotérmicos (310%), copos de vidro (286%) e objetos para cozinha (259%). Outros itens que se destacam são aparelhos eletromecânicos para uso doméstico (199%), artigos de higiene ou de toucador de plástico (184%) e bolsas plásticas (159%). O volume de produtos importados até US$ 50 de janeiro a abril deste ano (1,09 bilhão de unidades) é o maior para o período desde 2012 (1,21 bilhão), de acordo com a CNC. No total, as importações brasileiras cresceram 2,2% em valor e 5,3% em volume, no período. No caso somente de bens de consumo duráveis e semiduráveis, a alta é de 16,2% em volume.
O que chama a atenção, de acordo com a CNC, é a explosão nas compras de alguns itens de até US$ 50, como roupas, utilidades domésticas e outras “quinquilharias”, como dizem os lojistas. A pergunta que fica é se a partir de agosto, com a taxação de 20% sobre esses produtos, haverá algum freio nas importações em benefício da indústria e do varejo nacional. Para Fábio Bentes, economista da CNC, a resposta é não. “Pode até reduzir um pouco, mas, por conta da elevada carga tributária do país, o varejo vai continuar exposto a essa concorrência, que não é ilegal, nem desleal, é desigual”, afirma.
Um produto de US$ 10, por exemplo, vai chegar ao país agora por US$ 12. Com o ICMS de 17%, o preço sobe de US$ 11,70 para US$ 14,04. O consumidor não vai deixar de comprar um produto importado por conta deste aumento, que não é significativo, de acordo com Bentes. “A alíquota de 20% não é suficiente para dar um breque nessas importações. É apenas um paliativo. O governo equiparou, parcialmente, o importado com o produto brasileiro. O nosso setor paga 43% de impostos, em média”, afirma Aldo Macri, presidente do Sindilojas-SP.
Para ele, o imposto de importação para esses produtos teria de ser de 60%, alíquota que já vale para os importados com preços acima de US$ 50,01. O aumento das importações de peças de vestuário, diz Macri, resultou, no último ano, em uma queda de 20% nas vendas das lojas que vendem produtos com essa mesma faixa de preço. E o resultado disso, de acordo com ele, é o fechamento de dezenas de lojas, especialmente em bairros que concentram o atacado e o varejo de vestuário, como o Brás e o Bom Retiro. “Não consigo ver mais o retorno das atividades dessas lojas que fecharam as portas”, diz.
O setor de vestuário, diz Bentes, é o que tem mais sofrido com as importações, com base em dados da PMC (Pesquisa Mensal do Comércio), do IBGE. Em abril deste ano, o volume de vendas do varejo brasileiro foi 20% menor do que em fevereiro de 2019, antes da pandemia. “O real está se desvalorizando e a carga tributária, crescendo. O varejo nacional fica no fogo cruzado. A diferença de tributação em relação aos países asiáticos é muito grande”, diz.
Estudo do IBPT mostra que a carga tributária de itens comercializados no Brasil, com elevado potencial de importação, supera 50%. Eis alguns exemplos: vestuário e calçados (51%), eletrônicos (59,3%), produtos de beleza (65,9%), brinquedos (64,4%), eletrodomésticos (57%). Isto é, se um produto desses custa R$ 100, mais de R$ 50 referem-se a impostos. “Este é mais um desafio para o lojista brasileiro enfrentar. O varejista está acostumado com concorrência, só que tem de correr muito para ganhar de quem larga na frente”, diz Bentes.
A Tailândia é o país que mais avançou na remessa de produtos de até US$ 50 para o Brasil, de acordo com o levantamento da CNC. Nos primeiros quatro meses deste ano, as importações de itens da Tailândia subiram 123%, na comparação com igual período do ano passado. Coréia do Sul vem em segundo lugar, com alta de 122%, seguida de Paraguai (120%), Hong Kong (110%), Índia (109%), Itália (100%), Vietnã (100%), Japão (99%), EUA (93%), México (92%) e China (68%). Redes que operam com preços similares aos dos importados sentem menos, pelo menos por enquanto, o avanço dos importados, como a Caedu, rede com 89 lojas, a maioria na Grande São Paulo. “No geral, a entrada de importados sempre atrapalha, mas nós, como atendemos a classe C, somos menos afetados”, afirma Leninha Palma, CEO da Caedu.
O preço médio das peças comercializadas na rede é da ordem de R$ 25. “O nosso público acaba indo às nossas lojas até para não correr o risco de comprar um produto pela internet e não receber. Somos, portanto, menos vulneráveis”, afirma. Para evitar uma competição desigual, de acordo com Leninha, o produto importado e o nacional deveriam pagar as mesmas taxas de impostos. Em outras palavras, o que os empresários brasileiros querem é isonomia tributária.
Fonte: Diário do Comércio
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